O DEBATE SOBRE O SISTEMA FISCAL DEVE SER APROPRIADO PELA SOCIEDADE

“O debate sobre sistema fiscal não pode ficar restrito a algumas pessoas, mas deve ser apropriado pela sociedade como um todo. O Brasil é um país rico, mas possui um povo pobre”, disse o presidente do Instituto Justiça Fiscal, Dão Real Pereira dos Santos, durante a abertura da oficina “A Justiça Fiscal como instrumento para redução das desigualdades”, realizada ontem, no Plenário Ana Terra, na Câmara de Vereadores de Porto Alegre durante a programação do Fórum Social Temático.

O economista e pesquisador de política social da UnB, Evilásio Salvador, apresentou a desigualdade no sistema fiscal brasileiro. Segundo ele, o rico não paga imposto e quando paga, paga pouco como demonstra a publicação “A Distribuição da Carga Tributária: Quem Paga a Conta“.

Para o painelista, “tributo é o preço da cidadania” e que um exemplo de injustiça fiscal pode ser visualisado com o dado de que jatinho não paga IPVA enquanto que o carro popular paga. Além disso, ressaltou que a profunda regressividade dos tributos sobre consumo tem promovido grande parte da desiguldade social, na medida em que tributa com maiores alíquotas produtos mais essenciais. Em Santa Catarina, por exemplo, enquanto um iate está sujeito à alíquota de ICMS de 7¨%, os remédios pagam 17%.

Para Evilásio, ao longo dos anos, os princípios da Constituição Federal de 1988 foram sendo sutilmente modificados e as desigualdades sendo aumentadas.

Ele chamou a atenção para o fato de que a tributação é pouco utilizada para outros fins de interesse social, como a de proteção ambiental, por exemplo, o que já vem sendo feito em outros países. Além disso, segundo ele, “há uma falta de isonomia na tributação da renda: os trabalhadores é que pagam a maior parte da conta, enquanto lucros e dividendos são isentos do IR; a renda fundiária sofre uma pequena tributação que vai de 0,03% a 20%, além de possuirmos uma baixa tributação sobre os produtos financeiros”.

Roberto Bissio, jornalista uruguaio, diretor executivo do Instituto do Terceiro Mundo e coordenador da rede Social Watch, apresentou as peculiaridades dos sistema fiscais do mundo, que contribuem para a concentração de renda. Usando os EUA como exemplo, apresentou demonstrativo do quanto aumentou a concentração de riquezas nos últimos anos, e o quanto a tributação tratou de forma privilegiada os mais ricos e ressaltou que, com exceção dos países latino-americanos, todos os países centrais tiveram uma elevação na concentração das riquezas e que o aprofundamento das desigualdades nestes países é fortemente condicionado pela tributação e pela estrutura dos gastos públicos.

O jornalista uruguaio demonstrou que este movimento de aumento da concentração das riquezas vem acompanhdo com a criação e disseminação dos paraísos fiscais que se constituem em verdadeiros esconderijos para que os detentores de riquezas possam fugir das tributações dos países. Segundo ele, a maior parte do dinheiro, em torno de 60%, que circula pelos paraísos fiscais, diferententemente do que a maioria da população pensa, são oriundos de grandes empresas multinacionais, reconhecidas, algumas com importantes programas de responsabilidade social, mas que utilizam esta estrutura para reduzir seus custos tributários, em operações simuladas e ilegais.

Para o painelista Antonio David Cattani, economista e professor de sociologia da UFRGS, “é necessário personificar a riqueza de maneira que possam ser responsabilizados os causadores de crimes contra o meio ambiente, por exemplo”. Segundo ele, por trás das corporações estão pessoas, com CPF e endereço, e que se apropriam de riquezas sem qualquer compromisso ou responsabilidade com a sociedade, com o País ou com a própria humanidade e que se colocam acima dos Estados. Para o palestrante, não basta estudarmos a pobreza, mas é preciso conhecer a riqueza e que os paraísos fiscais são instrumentos de produção da desigualdade e de evasão fiscal.

Mariana Paoli, representante da organização CHRISTIAN AID encerrou a oficina do dia 25 convidando os participantes a fazerem parte da campanha que pede o fim do sigilo de paraísos fiscais em benefício dos mais pobres acessando Fim aos Paraísos Fiscais. A campanha foi iniciada por oito organizações há um ano atrás e atualmente já possui 50.

Segundo ela, a campanha objetiva que os líderes do G20 adotem medidas para acabar com o sigilo dos paraísos fiscais que permite que empresas escondam seus lucros e evitem pagar impostos em paises em desenvolvimento.

O evento é uma realização do Instituto Justiça Fiscal em parceria com do Sindifisco Nacional – Delegacia Sindical em Porto Alegre.  O Sindifisco estava representado pela auditora-fiscal Maria Salete Mocelin.

Hoje, está sendo realizada a Oficina “A Transparência nas Contas Públicas – Como é e Como deveria Ser, no Teatro Glênio Peres, no Legislativo Municipal de Porto Alegre.

FSM – Oficina JUSTIÇA FISCAL PARA A REDUÇÃO DAS DESIGUALDADES

Roberto Bissio,  jornalista uruguaio e coordenador da rede Social Watch , estará em Porto Alegre para participar da oficina JUSTIÇA FISCAL PARA A REDUÇÃO DAS DESIGUALDADES promovida pelo Instituto Justiça Fiscal e pelo Sindifisco Nacional – Delegacia Sindical em Porto Alegre. O evento acontecerá na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, nesta quarta-feira, dia 25, às 14 horas. Além de Roberto Bissio, participarão também deste painel o economista e professor da UNB Evilásio Salvador, o economista e professor da sociologia da UFRGS Antônio David Cattani e a representante da organização internacional CHRISTIAN AID e coordenadora da campanha de engenharia genética do Greenpeace, Mariana Paoli. 

UM DIA SEM ESTADO

*Dão Real Pereira dos Santos

Dentre as várias campanhas do tipo “Um dia sem carro”, “Um dia sem impostos”, Um dia sem sacolas plásticas”, “Um dia sem isso”, “Um dia sem aquilo”, lembrei de que talvez fosse interessante imaginar um dia sem Estado. A idéia não é nova, nem é minha, mas a tomei de empréstimo de um colega ativista do programa de educação fiscal de Porto Alegre que comentava, em evento na Feira do Livro, que antes de se pensar em um dia sem tributos, deveríamos pensar num dia sem Estado.

Retomo este tema, pois recentemente acompanhamos a situação quase beirando ao caos, na cidade de Fortaleza, no Ceará, provocada por uma greve de policiais militares e bombeiros. Em seis dias de paralisação, a cidade praticamente entrou em pânico: motoristas de ônibus ameaçavam greve por absoluta falta de segurança para trabalhar; lojas fechavam no meio da tarde; assaltos aconteciam em todos os lugares; turistas desistindo de viajar para aquela cidade; etc.

Numa primeira visada fica até difícil imaginar que um dia sem Estado pudesse provocar algum desconforto, pois na rotina do cotidiano das pessoas não se percebe com clareza a presença e a importância do Estado. Além disso, já está meio que incrustado no imaginário popular uma certa rejeição à idéia de que o Estado seja algo necessário e imprescindível, e quem não usa diretamente os serviços públicos tende a achar que o Estado mais atrapalha do que ajuda. Por um lado, isso é até compreensível, haja vista a predominância de uma cultura midiática que recorrentemente idolatra o que é privado e deprecia o que é público. Por outro, acho que isso também decorre da natureza humana. Tem coisas que a gente só percebe quando falta, como a saúde, a água, a energia elétrica, a visão, a vida, o ser amado, a paz, etc. E só se percebe quando estas coisas faltam de uma hora para outra. Se a falta se dá de forma lenta, nos acostumamos e não percebemos. É tão normal contar com estas coisas, que normalmente estão presentes, que vamos aos poucos perdendo a capacidade de reparar que elas existem. O Estado talvez esteja nesta classe de coisas.

O exercício que estou propondo é de pura imaginação. Como seria Um Dia Sem Estado?

Ao acordar pela manhã, certamente não perceberíamos muita coisa. Talvez uma falta de energia elétrica ou de água. Até aí, nada de mais. Ao sair de casa, como a falta de Estado já estava anunciada, somos assaltados na parada de ônibus, pois sem Estado, não há polícia, e também não há Lei, e ,como todos sabem, o crime é organizado e se organiza de forma muito rápida, pois não está preso pelos controles nem pela burocracia.

Um dia sem Estado não deve ser interpretado como sendo um dia de paralisação do Estado, mas um dia em que ele simplesmente não existe. Portanto, ainda que o Estado volte a existir no dia seguinte, não poderia atuar sobre os fatos daquele dia sem Estado. Então, neste dia, não há Lei e, portanto, ninguém poderá ser punido por atos que tenha praticado.

Muitos não poderão sair de casa, pois sem escolas públicas e sem as creches populares, não haveria com quem deixar as crianças. Outros, sabendo que não haverá Estado, vão se organizar para deixar as crianças com quem já não tem trabalho.

Os crimes, ou seja, aquilo que era crime quando o Estado existia, certamente se multiplicarão, e de forma muito rápida, pois sem o Estado, o único elemento restritivo aos abusos individuais será a consciência de cada um. A chance de voltar para casa sem ter sido vítima de roubo ou de alguma agressão é muito pequena. Quando conseguir pegar um ônibus, já que poucos circularão por falta de segurança, as passagens certamente estarão bem mais caras. Não havendo fiscalização, as empresas aproveitarão o dia sem Estado, sem regulamentação, portanto, para tentar melhorar sua situação financeira. Não se sabe quando o Estado voltará a existir, portanto será importante ganhar o máximo possível.

Ah, também não haverá passagem livre para idosos, nem passagem subsidiada. No trânsito, sem controle público, acidentes ocorrerão por toda parte. Imaginem um desses acidentes em que vários veículos se chocam e diversas pessoas ficam feridas na rua. Algumas mortes, inclusive. Levará horas até que os feridos sejam socorridos. Não haverá serviço público de socorro. A SAMU não existirá neste dia. Os particulares é que deverão ajudar os feridos e isso dependerá da boa vontade de cada um. Também não haverá perícia, nem IML para remover os corpos dos que morrerem. O trânsito será um verdadeiro caos. Não haverá fiscalização e cada um seguirá segundo sua pressa. Os semáforos e controladores de velocidade, mesmo funcionando automaticamente, não produzirão qualquer efeito, pois não haverá penalidades a serem aplicadas nem Estado para aplicá-las.

Os hospitais públicos estarão fechados e servidores públicos não existirão neste dia. Então só restará aos acidentados e aos doentes em geral o socorro pago. Quem conseguir chegar a um hospital e tiver condições de pagar será atendido. Quem não conseguir ficará à sua própria sorte. Não haverá distribuição gratuita de medicamentos nem SUS.

Um incêndio num edifício ficará ardendo até que a última chama resolva se exaurir por falta do que queimar. Por mais que as pessoas tentem, voluntariosamente, apagá-lo, com seus baldes de água, extintores e mangueiras, sem os bombeiros organizados e equipamentos públicos adequados, as chamas serão implacáveis.

No centro da cidade, onde a população insiste em se concentrar todos os dias, arrastões se sucederão propagando pânico entre as pessoas. Os estabelecimentos comerciais fecharão suas portas. As pessoas serão roubadas até seu último centavo.

Velhas rixas serão resolvidas em verdadeiros campos de batalha. Diversos assassinatos sem prisões. Sem Lei, não haverá crime nem punição. No dia sem Estado, os presídios ficarão desguarnecidos. Será cada um por si.

As fronteiras ficarão escancaradas. Uma oportunidade que rapidamente será aproveitada por milhares de contrabandistas e traficantes nacionais e estrangeiros que resolverão abastecer o mercado interno de produtos piratas, produtos falsificados, produtos que não atendem as condições sanitárias, armas e drogas, tudo para atender ao mercado interno por um grande período de tempo. Será momento de fazer estoques. A enxurrada de produtos sem impostos e sem qualquer regulamentação ou proibidos, sem dúvida, colocará em risco a economia doméstica, a saúde pública e a segurança por um longo período.

Não podemos esquecer que no dia sem Estado, não haverá forças armadas. Então não se poderá cogitar em colocar o exército nas ruas e nas fronteiras para garantir a ordem. Além disso, aquelas partes do território nacional, que sempre foram cobiçadas por nações estrangeiras, poderão ser ocupadas sem qualquer resistência. Talvez até surjam focos de conflitos internacionais para decidir quem terá precedência nesta ocupação. Quando o Estado voltar a existir, a situação já estará posta, e só uma guerra poderá fazer voltar ao que era antes.

O controle de tráfego aéreo não existirá e cada companhia terá que assumir os riscos de voar ou não. Algumas, por questões de segurança, cancelarão seus vôos e os aeroportos ficarão abarrotados de gente aguardando a volta do Estado.

Como no dia sem Estado será perigoso sair às ruas, a maioria das pessoas ficará em casa, faltará ao trabalho e cancelará seus compromissos. Outros sairão desesperadamente atrás de algum trabalho que lhes garanta pelo menos mais um dia… Vá que o Estado não volte amanhã! Muitas indústrias não funcionarão por falta de funcionários ou por diversos outros motivos. Outras, no entanto, conseguirão transportar seus empregados de casa até as fábricas sob escolta para protegê-los de assaltos e arrastões e manterão sua produção funcionando. Claro que o custo deste transporte e segurança será descontado dos salários. Aliás, no dia sem Estado, o próprio valor do trabalho também será renegociado, pois salário mínimo também é coisa de Estado.

Antes da metade do dia, as ruas já estarão abarrotadas de lixo. Cada um vai querer se livrar do seu, o mais rápido possível. Como a situação de falta de Estado pode não cessar, embora a proposta inicial fosse de apenas um dia, pois o amanhã é futuro e futuro não existe, exceto como expectativa de hoje, cada um resolverá seus problemas segundo suas próprias condições físicas e materiais. Assim, os comerciantes que tiverem condições contratarão sua própria segurança e poderão explorar seu negócio, enquanto os problemas de acúmulo de lixo, de saneamento, de falta de abastecimento de água e de energia elétrica não tornarem as condições insustentáveis. Tendo que arcar com todos os custos envolvidos muito poucos negócios subsistirão. Claro que os preços também serão aumentados para cobrir estes custos. Filas se formarão para aproveitar a grande liquidação de produtos estrangeiros contrabandeados que rapidamente chegarão às grandes cidades.

E se o Estado não voltar mais? A falta de perspectiva quanto ao futuro significa também não haver garantia de previdência para a velhice. Até os serviços privados de saúde, de segurança, de educação, etc, ficarão precários, pois inclusive estes, que constituem alternativa ao próprio Estado (embora alguns pensem que seja o contrário), para funcionarem, necessitam de transporte público para seus funcionários, trânsito controlado, energia, água, segurança, saúde, assistência, previdência, saneamento, etc, etc. Cada um terá então de encontrar sua forma de sobreviver e de garantir a sobrevivência dos seus.

A produção nacional diminuirá, o comércio formal ficará prejudicado, não haverá trabalho, não haverá garantia de lucros, não haverá garantia de salários. Só o comércio dos produtos contrabandeados é que terá condições de se desenvolver, claro, enquanto existir alguma reserva de recursos nas mãos das pessoas. Quem se sentir prejudicado não poderá recorrer à justiça. Então, na lei do cada um por si, predominará, sem dúvida, a lei do mais forte. Quem tiver mais, quem roubar mais, quem explorar mais, terá uma sobrevida maior. Esta será a percepção que orientará o comportamento das pessoas neste dia sem Estado.

Sem a garantia de que amanhã haverá Estado e tudo voltará ao normal, muitos resolverão abandonar o País e emigrar para o exterior. No entanto, os países vizinhos antevendo este problema, fecharão suas fronteiras contra estes novos refugiados. A população ficará aprisionada em seu país sem Estado, pelos outros países com Estado.

A iluminação pública não funcionará. À noite, no escuro, a cidade será território dos bandidos, daqueles que fugiram dos presídios, daqueles que viviam contidos pela presença do Estado, mas também daqueles que encontrarão na expropriação alheia a sua própria sobrevivência.

Não faltarão líderes para tentar reorganizar as pessoas no enfrentamento das dificuldades produzidas pela falta de Estado, pois, como todos sabem, não há espaço vazio. Onde o Estado não existe, alguém fará a vez. Sem Lei, também estas lideranças disputarão seus territórios e cada um conquistará mais adeptos e simpatizantes quanto mais vantagens e segurança oferecer às pessoas, quando não se impuserem pela força de seus bandos e pela subjugação. Afinal, armas não faltarão no mercado.

Pintada dessa forma, a situação parece muito mais caótica do que seria na realidade. Até porque um único dia sem Estado pode passar mais rápido do que o tempo necessário para que tudo isso pudesse acontecer ou ser percebido. No entanto, a falta de expectativa de seu retorno, certamente potencializaria os efeitos negativos da falta de Estado, na medida em que cada um será impelido a garantir, por si, o seu futuro, e quando o valor em questão é a sobrevivência, outros valores certamente sucumbem.

Posso, no entanto, estar absolutamente enganado na leitura dos efeitos que este exercício de imaginação propõe, e nada disso acontecesse, pois os valores humanos, sociais e morais das pessoas, como a solidariedade, espírito público, responsabilidade social e respeito ao próximo, já estão suficientemente arraigados para evitar que a falta de Estado signifique o retorno à barbárie.

Mas, claro, e antes que eu esqueça, no Dia Sem Estado ninguém pagará impostos.

*Presidente do Instituto Justiça Fiscal

A Transparência nas Contas Públicas em debate no Fórum Social Mundial em Porto Alegre

Como é feita, por que é assim e como deveria ser a transparência nas contas públicas é o foco que será abordado na Oficina de Trabalho “A Transparência nas Contas Públicas como importante instrumento para o alcance de uma maior justiça fiscal com uma melhor alocação dos recursos públicos e, consequentemente, uma diminuição da corrupção”. A oficina é uma iniciativa do Instituto Justiça Fiscal em parceria com o Sindifisco Nacional – DSPOA juntamente com outras organizações sociais e será realizada no Fórum Social Mundial Temático – FSMT, no dia 25 de janeiro.

O evento ocorrerá durante todo o dia e pretende debater sobre essa constante reivindicação da sociedade civil. Os organizadores do evento questionam se unicamente a divulgação de números na internet é o suficiente para resolver a questão da ótima alocação dos recursos e da corrupção eventualmente existente. Para o presidente do IJF, Dão Real Pereira dos Santos, a transparência não pode ser vista como um fim em si mesma, mas um instrumento na busca pela justiça fiscal. Segundo ele, “É preciso garantir mais do que a simples publicação de números, mas a plena compreensão da sociedade sobre as motivações das políticas públicas”.

O Fórum Social Muncial, que tem como tema Crise Capitalista, Justiça Social e Ambiental, será preparatório para a Cúpula dos Povos da Rio+20, iniciativa de movimentos sociais e ambientais, organizações, redes e grupos da sociedade civil mundial que acontecerá paralelamente à Conferência da ONU. Maiores informações no site Fórum Social Temático, www.fstematico2012.org.br e pelo e-mail fstematico2012@gmail.com.

 O local da oficina ainda será definido pela organização do FSMT e as inscrições podem ser realizadas pelo e-mail contato@institutojusticafiscal.com.br.

Desigualdade Econômica Não é Sustentável

O 1% do topo tombará sem uma classe média estável

Por Heather Boushey | 6 de Dezembro de 2011, Center of American Progress

O Presidente Obama herdou uma economia em virtual colapso, com perda de mais de 20 mil empregos por dia no mês que ele foi empossado. Mas os problemas foram muito mais profundos do que uma simples recessão. Muito antes da Grande Recessão de 2007-2009, as velhas regras do jogo – em que, se você trabalha duro e joga de acordo com as regras, você pode ter uma vida decente – tinham começado a ruir.

Na recuperação econômica dos anos 2000 – do pico em 2000 até perto do final de 2007 – a classe média (americana) não se beneficiou do crescimento da economia. Ao longo desse período, a economia cresceu cerca de 18%, quando medida pelo PIB, no entanto a renda média familiar caiu 0,6%. Acrescente-se que, ao longo das últimas décadas, com exceção dos anos de pleno emprego no final da década de 90, a economia americana se tornou cada vez mais desigual. A renda das famílias mais ricas cresceu a uma média de 1,2% ao ano entre 1979 e 2009, enquanto que as das famílias mais pobres caíram 0,4% ao ano.

O discurso conservador diz que a crescente desigualdade não é problema para a América, pois os ganhos daqueles no topo irão, eventualmente, recair sobre a classe média (o velho “efeito cascata”). Mas não foi o que aconteceu nas últimas décadas. Na realidade, aconteceu o inverso.

Uma economia sobrecarregada com riqueza no topo não é boa para o país ou para a economia. Desigualdade não é ruim apenas para os 99% que são deixados para trás; ela é, na verdade, a responsável por alguns dos maiores problemas que os americanos enfrentam hoje – alto índice de execuções hipotecárias com retomada de casas, alta taxa de desemprego e uma incapacidade de seguir adiante. É fundamental que revertamos essa situação.

Pegue, por exemplo, a bolha imobiliária dos anos 2000. Foi estimulada em grande parte por hipotecas “exóticas” que foram fatiadas, separadas e vendidas a investidores que pressionaram os preços das casas a alturas até então desconhecidas. E quando a bolha estourou, milhões de famílias americanas – sem culpa alguma, exceto sua decisão de comprar uma casa – ficaram com hipotecas maiores do que o valor de suas casas. Alto índice de retomadas das casas pelos bancos ainda infestam nossa economia.

O que é pouco discutido (até recentemente) é o papel desempenhado pela desigualdade em causar a Grande Recessão e a subsequente lenta recuperação que aconteceu inicialmente. A desigualdade tem crescido por décadas para a maioria dos americanos na forma de estagnação da renda para a maioria e na verdadeira explosão das rendas para aqueles no topo. Quando a renda parou de crescer, as famílias responderam trabalhando mais e se endividando mais. Como a ativista dos direitos dos consumidores Elizabeth Warren (com sua filha Amelia Warren Tyagi) documentou, a dívida dos americanos é o resultado direto de uma classe média enfraquecida. As famílias se endividaram para pagar as despesas, para cobrir os custos dos planos de saúde, para colocar o filho na faculdade e para comprar uma casa em um bairro com boas escolas.

O setor financeiro estava feliz demais para ajudar. Cada vez mais livre de regulamentação e cheia de dinheiro, Wall Street criou uma variedade de novas maneiras de criar e estender o crédito. Basicamente, a América não conseguiu um aumento e o setor financeiro disse: “Não se preocupe, companheiro, nós vamos lhe emprestar o dinheiro para pagar as contas”. Claro, a coisa toda era insustentável. Com isso, veio a Grande Recessão e, desde então, os americanos lutam diariamente para pagar as suas contas, mas nós podemos reverter esse rumo destrutivo – se entendermos o que estamos enfrentando.

Uma recente pesquisa dos economistas Michael Kumhof e Romain Rancière, do Fundo Monetário Internacional, mostra que os investidores estavam reciclando suas altas rendas em empréstimos, um processo inerentemente instável em razão da estagnação das baixas e médias rendas familiares. Como a demanda cai por causa da estagnação das rendas, aqueles no topo tiveram grandes incentivos para expandir o crédito para manter o poder de compra;  mas se a renda não se recupera, esse é, como nós temos visto, um sistema instável.

Wall Street também usou sua crescente riqueza para beneficiar o seu setor financeiro, não a nação como um todo. Pesquisa recente dos professores Atif Mian, Amir Sufi e Francesco Trebbi, da University of Chicago Booth School of Business, mostra que as maiores contribuições para campanhas políticas feitas pela indústria de serviços financeiros estão associadas a um aumento da probabilidade de votos para uma legislação que transfere riqueza dos contribuintes para este setor.

As altas rendas do pessoal das finanças lhes permitiu vender empréstimos aos 99% e comprar legislação que transfere riqueza dos contribuintes para eles próprios. E, além de tudo isso, essas mesmas “altas rendas” têm encorajado os melhores e mais brilhantes jovens a ingressar nas finanças ao invés de engenharia, medicina, magistério, áreas que aumentam nossa produtividade econômica.

Mas nós sabemos o que funciona para todos os americanos. Crescimento para todos nos mantém seguindo em frente. Os economistas do FMI Andrew Berg e Jonathan Ostry descobriram que a desigualdade está associada com resultados econômicos mais modestos. Eles examinaram quanto tempo períodos de crescimento econômico sustentável duraram em 174 países. O que eles descobriram foi impressionante: quanto mais igualitário o país, por mais tempo ele foi capaz de sustentar o crescimento econômico.

O que acontece aos 99% de americanos deveria ser o foco da política econômica de nossa nação. Porém, muito frequentemente, isso não acontece. Concentrar-se exclusivamente na redução do déficit ou na redução dos custos são políticas erradas. Concentrar-se em empregos é a política correta, agora e no futuro. Investir no nosso futuro é a política correta – através da despesa pública que fortaleça a nossa economia e a nossa competitividade econômica, acompanhado de uma atitude responsável pela redução dos déficits orçamentários federais de longo prazo, enquanto a economia melhora.

Não tema. Nós podemos reverter a desigualdade. Os Estados Unidos continuam sendo uma das nações mais ricas do planeta. A noção de que não podemos consertar a nossa economia é simplesmente bobagem. Nós podemos se tivermos vontade política.

 Heather Boushey é Economista Senior no Centro para o Progresso Americano.

Tradução de Carolina Vital Menegaz Klein, Agente Fiscal do Tesouro do Estado e associada do Instituto Justiça Fiscal.